16/04/2010

Uma polícia única?

por PAULO PEREIRA DE ALMEIDA
E sta crónica poderia começar com o mesmo título - "Uma polícia única?" - mas sem o ponto de interrogação. Seria, todavia, uma precipitação na forma e no raciocínio, se bem que existam - desde há cinco anos para cá, concretamente desde 2005 - sinais claros que apontam no sentido da unificação das polícias portuguesas.
Unificação não significa - deixemos desde já claro - univocidade. A potencial existência de uma polícia nacional, única no seu figurino orgânico, não significará, naturalmente, um tratamento indiferenciado das suas atribuições e competências. Bem pelo contrário, os princípios devem ser - em meu entender - dois: o princípio da especialização, com a criação de unidades orgânicas de intervenção nacional e, eventualmente, interna- cional com competências claramente definidas; e o princípio da complementaridade, pensando-se na intervenção das Forças Armadas (FA) em território nacional nos momentos e circunstâncias em que a intervenção das Forças de Segurança (FS) se revele, pela sua natureza e meios, menos adequada. Este princípio de complementaridade na acção entre as FA e as FS já tem, aliás, sido testado em operações conjuntas - e, diga-se, muito bem-sucedidas - no território português. Mais: num momento em que a União Europeia discute um conceito integrado de segurança (e, portanto, de segurança interna) está necessariamente aberto o debate sobre o papel a desempenhar pelas FS e pelas FA na segurança e na defesa do território e das pessoas.
Naturalmente que a questão da unificação das polícias apresenta outras especificidades. Por exemplo, a motivação para a eficácia das FS será a de "fazer mais com menos" - para citar o Estudo da Consultora Accenture, de 2006 -, reduzindo custos e simultaneamente melhorando a qualidade no serviço prestado às populações. Como é que isto será possível? Essencialmente de três maneiras. Em primeiro, libertando recursos humanos, uma vez que existem, e ainda segundo o mesmo estudo, pelo menos seis mil efectivos das FS afectos a funções de suporte, que portanto desempenham funções não operacionais de polícia; estes poderão ser reconduzidos para outros serviços da administração pública. Em segundo, poupando dinheiro, uma vez que a unificação das polícias permitiria ganhos estimados superiores a cem milhões de euros por ano, e isto considerando apenas a redução dos custos de formação e de pessoal. Por fim, e em terceiro, unificando serviços e procedimentos, permitindo assim racionalizar gastos e simultaneamente pensar na qualidade do atendimento dos potenciais "clientes" das polícias que, afinal, somos todos nós.
Estou, obviamente, consciente de que esta é uma matéria que carece de discussão e, inevitavelmente, de algum consenso. Aliás - e no quadro do think tank organizado pelo Observatório de Segurança Criminalidade Organizada e Terrorismo (OSCOT) na passada terça-feira para a análise do Relatório Anual de Segurança Interna (RASI) - o deputado do PSD Fernando Negrão considerou que este é o momento para se começar a pensar nesta unificação, mas o presidente do OSCOT, José Manuel Anes, achava que ainda é cedo para se tratar o tema. Discordo. Estou bem consciente - pelos contactos que tenho feito, pelos responsáveis que tenho ouvido - de que existe uma vontade genuína de debater o tema. Fica o desafio.

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